quinta-feira, 16 de junho de 2011

Ritual de Aceitação ou Higlander Nazareno

Enzo, meu guri, a sequencia de aventuras e loucuras do seu pai e "gang" ganha corpo e vai fazendo história. Temos aqui mais um texto da sua alucinada Tia Elly, irmã que eu amo profundamente, e ama profundamente seu pai - Somos todos muito profundos....


"Lembro com muito gosto", como diz Caetano Veloso, de sua tia Zéu, mãinha de Elly - e minha também - uma mulher fantástica, de humor refinadíssimo e que sempre saía com um comentário - que eu considero o cúmulo da ironia - quando ouvia ou via algo muito imbecil ou óbvio demais. Ela dizia
séria: Mas isso é de uma profundidade... Eu, Dan, Elly,Jorginho e "gang" - Somos todos uma grande gang! - rolávamos de rir... Bom, chega de delongas - mania besta de dublê de escritor ficar nesse joguinho espirituoso com as palavras - e vamos à história, que por sinal, é divertidíssima!



Era final de ano. Parece que todas as histórias com Dani remetem a tempos natalinos, mãinha e eu passávamos por algumas dificuldades financeiras, mas como toda casa de interior, pintar as paredes no final do ano parece lei.

Estávamos assistindo TV, era noite de sexta-feira e de repente bate a porta:
- Tia Zéu, joga a chave – Era Daniel.
- Menino, você chegou foi cedo – Disse Mãinha.
Morávamos no primeiro andar de um sobrado no bairro do Jacaré, em Nazaré das Farinhas. Para facilitar nossa vida e não precisarmos descer o tempo todo, amarrei um pedaço de elástico na ponta da chave, onde, de lá de cima, jogávamos a chave sem machucar ninguém, nem errar a mira, mas com Daniel nada era mesmo normal. Ele fazia questão de puxar a chave, esticar o elástico e soltar, o que fazia a chave da porta voltar com uma violenta velocidade e bater no teto da varanda, mãinha sempre ficava muito retada, mas dava pra ouvir a gargalhada de Dani no final da rua, então sabia que meu final de semana estava começando com direito a todas as festas que aguentasse ir, e as que não aguentava também, pois ele não nos deixava ficar em casa.
Dani subia as escadas com seu riso maroto e quatro ou cinco garrafas de cerveja na mão e às vezes a mochila da viagem, já exclamando.
- Tia Zéu tem feijão!?!?
- Que gracinha, você já foi em casa ver sua mãe?
- Já sim, dei um beijo nela e peguei o carro de painho.
- Já que é assim, então vamos para cozinha.
Ele sempre se dirigia à geladeira, para guardar as cervejas e aí via, ao lado, no fogão, a panela de feijão. Então com um tomate na mão, pedia para mãinha:
- Tia Zéu, um tomatinho.
Mãinha já sabia que ele queria salada e não se fazia de rogada para encher sua pança.
Então sentávamos na mesa da cozinha e ali, fumávamos, bebíamos e mudávamos o destino político de Nazaré várias vezes até altas horas da madrugada.
 Neste dia em especial, mãinha contou a Dani da dificuldade que passávamos e o quanto queria pintar a casa, ele se levantou olhou novamente a panela de feijão, pegou sua pastinha preta e a mochilinha, e disse:
- Tia Zéu, amanhã resolvo esse problema, vamos pintar a casa de qualquer maneira.
Mãinha, cheia de esperança, mal sabia o que a esperava.
Nos dia seguinte, era sábado, muito cedo já ouvia a gargalhada de Dani na cozinha, então levantei e ele, com sua presença de espírito disse:
- Acorda prá cuspir, vai logo se arrumar que temos que buscar a equipe, para pintar a casa.
- Dani, você é maluco, contratou alguém? Sabe que não temos dinheiro para pagar.
- Relaxe, tudo vai dar certo. VAI LOGO SE ARRUMAR!!!!!!!!!!
Então saímos e começamos a pegar o pessoal do baba, primeiro passamos na casa de Gordo, depois passamos para pegar João Paulo, seguimos para casa de Léo e Inho. Quando enchemos o carro, vejo a conversa dos meninos.
- Sim, Dida vamos jogar bola? – Perguntou Gordo.
- Não, vamos fazer um exercício melhor – respondeu Daniel gargalhando.
- Dani, você não disse aos meninos o que vamos fazer? - Perguntei já assustada.
- Relaxe Elly, quando chegarmos em sua casa eles vão ver.
Dani passou na loja de tintas e pegou o restante de material na conta de tio Zé, para começarmos a pintura.
 Quando chegamos em casa, ele inventou que era um ritual de aceitação: para fazer parte da galera todos tínhamos que fazer uma boa ação, que neste caso era pintar minha casa.
Todos entraram e Dani, às gargalhadas, começou a distribuir lixas para lixar as paredes antes de começarmos a pintura. No início achamos que não daria certo, então ele, com seu poder de convencimento, colocou todo mundo para trabalhar e em questão de horas a casa parecia uma festa. Fabiano, irmão de Gordo, a quem chamávamos carinhosamente de Nanato, estava chegando também e logo foi convocado para participar da empreitada, Daniel não deu tempo nem do menino respirar e foi buscá-lo na rodoviária sem que Nanato tivesse tempo para manobra.
Casa de interior, a parede termina antes do telhado deixando uma falha entre o telhado e a parede. Para pintar melhor, Gordo inventou de ficar em pé nesta falha e pintar a parede por cima, Daniel logo começou a gritar:
- Tia Zéu, um macaco, um macaco
- Menino! Desça daí, Gordo, para você não se machucar! - Exclamou mãinha temerosa.
- Elly, vamos tentar acertar o macaco? - Gargalhando, Daniel se dirigiu até a parede onde estava Gordo.
Então da cozinha só ouvimos os gritos desesperados.
- Não Daniel, Porra, vou cair, não Daniel!!!!!!! NÃO!!!!!!  (Pôu, Puf.)
Uma porrada seca escutamos da cozinha e logo corremos para ver o que havia acontecido. A cena era a seguinte: Daniel em pé quase tendo um troço de tanto rir, Gordo estatalado no chão parecendo morto, mas rindo também. Mãinha e eu desesperadas corremos para ajudar, aí Gordo levantou do chão, falando:
- Eu sou Highlander!
E todos caímos na risada.

Resumo da ópera: a casa ficou pintada e linda para o Natal, graças ao super Dida.

Dani, onde você estiver, meu irmão, só tenho a te agradecer por ter-nos escolhido como sua família, ainda dói muito, mas relembrar essas histórias e suas gargalhadas nos dá um alento e a certeza de nosso reencontro traz de volta a esperança.

VIVA DANIEL!!!!!!!




4 comentários:

  1. Parei tudo para ler.
    Essa é a segunda vez que leio e releio, cada vez que leio dou mais risada.
    Dida me surpreende a cada dia.
    Estou adorando conhecer um pouco mais da vida do nosso irmão e poder deixar tudo isso registrado para Enzo.

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  2. Ai que saudade de vocês... saudade de encher o peito ao passar pelo Jacaré gritando: ELllyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyyy.... Quero o feijão da minha tiaaaaa...

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  3. Não sei mais com o que me emociono - se com os posts ou com os comentários...Na verdade, ambos me deixam à flor da pele.

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  4. Saudade desse tempo Gordinho. Ouvir vcs me gritando.

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